Enquanto a bola rola em campo, nos bastidores da CBF, de federações e
ligas, criou-se um esquema de corrupção que mantém no poder privilegiado
grupo de dirigentes há mais de 20 anos. A reportagem “os coronéis do
futebol”, levada a público pelos veículos da RBS, revela detalhes dessa
operação, com indícios de repasses milionários, manobras eleitorais, ligação com a política partidária, perseguição a oposicionistas. Um escândalo que explica a crescente dívida dos clubes e a decadência do futebol brasileiro no âmbito mundial. Uma estrutura milionária a serviço de uma elite, com privilégios e mordomias. É a cópia de velha prática da história nacional na figura dos coronéis e cartolas.
O coronelismo começou quando a Coroa distribuiu as terras em capitanias
hereditárias a parentes e amigos. Grandes proprietários rurais detinham
total poder sobre as áreas e a população. Mesmo com a proclamação da
república, continuaram com absoluto domínio, pois a riqueza nacional vinha
da produção agrícola. Mantinham o controle sobre o povo de baixa renda,
trabalhadores pobres, quase todos analfabetos. Por isso recebiam o nome de coronéis, embora sem farda. Dispunham da polícia para proteção das terras, além de autorização do governo para comprar armas e manter milícias a seu serviço. Em troca, retribuíam com os votos dos eleitores locais. Eleições eram fraudadas mediante ameaças, troca de votos, sumiço de urnas, voto de fantasmas e falecidos. É o que se conhece por “voto de cabresto” e “curral eleitoral”. Compravam votos em troca de bens (alimentos, sapatos, óculos).
Seu prestígio era proporcional ao número de votos e revertia na continuidade de favores e proteção de governantes estaduais e federais. Assim a elite se perpetuava no poder. Ainda há coronéis Brasil afora, apesar da evolução democrática.
Cartola é designação pejorativa de dirigente esportivo que faz uso usa do
cargo e do prestígio para ganhos e vantagens pessoais. Cartola é chapéu
masculino de aba curta. A origem do termo deve-se ao fato de os dirigentes,
no passado, usarem cartola e elegantes ternos. Entravam nos estádios com os atletas em postura exibicionista. Alguns eram ligados ao jogo do bicho.
Apesar da profissionalização, ainda existem cartolas em clubes endividados.
Agora o chapéu caiu e o torcedor parece não acreditar. A venda de votos por
sapatos, óculos e alimentos foi substituída por medalhas, troféus,
uniformes, passagens aéreas, jantares, hospedagem. A coação se faz pela
barganha e ameaça do corte de repasses financeiros. Até quando coronéis e
cartolas persistirão? O futebol é grande fonte de recursos. Não pode, porém,
perder a credibilidade e o encanto. O dinheiro do torcedor, movido pela
paixão, é a fonte dessa riqueza. Não pode servir para falcatruas a serviço
de interesse privado de uma minoria. Levanta teu grito, torcedor. Abaixo
coronéis e cartolas!
Artigo publicado no jornal Zero Hora Esportes, coluna “De fora da área”, de 08/07/2015