UMA VISÃO SEMÂNTICA DO TRABALHO
Jornal do Comércio, de 24 de maio de 2010
A linguagem reflete a cultura de cada época. Ao estudar a origem do termo trabalho, entendem-se as relações sociais. Do latim “tripalium”, três paus, era antigo instrumento de tortura em que se empalavam os condenados. Por isso, dizer que o trabalho enobrece não é de todo verdadeiro. Bem pago e prazeroso, enobrece e gratifica. Do contrário, torna-se uma tortura, ainda bem que sem o “tripalium”.
Assim o verbo “tripaliare” significava sofrer. Depois assimilou o sentido de lutar. Mais tarde, incorporou a noção de exercer um ofício. Apesar da evolução, constata-se a ideia de que denota sacrifício. O termo não se libertou do instrumento de tortura. Quem incomoda, dá trabalho. Para dar à luz, a mulher entra em “trabalho de parto”, dor compensada pela alegria da nova vida. O burro de carga é o sujeito de pouca inteligência, afeito a serviço pesado.
Ócio é descanso em oposição a trabalho. No senso comum, o pai dos vícios, já que desocupado vive matutando o mal. Hoje, porém, surgem defensores de um tempo de ócio, o ócio criativo, para manter o espírito criativo, melhorar a qualidade de vida, sem prejuízo à capacidade produtiva. Do latim, “otius” tinha o sentido original de trabalho mental, privilégio só dos nobres, pois era o tempo dedicado ao estudo das ciências. Os plebeus não podiam ocupar-se com o ócio: eram obrigados a trabalhar para viver e manter os nobres, detentores do poder e dos bens. Verifica-se, assim, que a escola nasceu do ócio, privilégio dos nobres, e explica a alienação e a exclusão das camadas pobres.
Negócio, do latim “neg”, não, e “otius”, negação do ócio. Assumiu o sentido de transação comercial, compra, venda e troca. Daí surgiu o burguês e os burgos – local de negócios, as futuras cidades – e a classe burguesa. Quem negociou e ficou rico, está com o burro na sombra. Os demais seguem a luta de trabalho, muitos semiescravos, como burros de carga em pleno século 21.
Professor e escritor Ari Riboldi